E a Dança do Ventre Chega nas Américas...

Little Egypt - Farida Mazar

Foi no palco da Midway que artistas do lado de fora realizavam suas performances na esperança de atrair clientes para a magia estrangeira e exóticos tesouros os aguardavam do lado de dentro. Uma destas artistas era Farida Mazar Spyropoulos, vista no filme aqui, que era membro do “As Dançarinas Argelinas de Marrocos”. Com homens de turbantes tocando estranhos instrumentos, ela e outras meninas dançavam uma dança tradicional chamada Raks Sharki, uma dança tradicional não é tão tradicional assim para uma cultura acostumada com valsas formais e decoro. Apesar de haver um número de dançarinas que estavam geralmente presente para entreter e seduzir, foi Fátima (como preferia ser chamada) quem que chamou mais atenção. Era um espécime de beleza feminina, mostrando seus braços nus, girando de forma provocante e provavelmente rindo sobre isso. As mulheres ficaram chocadas, dando suspiros de desânimo vitoriano,os homens também ficaram chocados dando a máxima atenção e provavelmente sorrindo também.

Farida era síria, esposa de um dono de restaurante de Chicago e empresário de sobrenome Spyropoulos, que era nativo da Grécia. Foi anunciada com Fátima, mas por causa do seu pequeno tamanho, passou a ser chamada de Little Egypt, como um apelido nos bastidores.

Farida popularizou a forma de dança que veio a ser conhecida como Hoochee-Coochee, ou shimmy & Shake. Naquela época a palavra bellydance ainda não tinha entrado no vocabulário americano, como Spyropoulos foi a primeira nos Estados Unidos a demonstrar a “danse du ventre” (literalmente dança do ventre) a dança passou a ser chama de Hoochee-Coochee. Hoje a expressão hootchy-kootchy geralmente significa uma dança erótica e sugestiva e é muitas vezes erroneamente confundida com o grupo de danças originárias do Médio Oriente que hoje chamamos de dança do ventre. Devido ao grande sucesso e ao grande numero de imitadoras, dança passou a ser chamada de Little Egypt, confundindo dança e dançarina.

Sol Bloom, diretor de entretenimento para a Exposição (e mais tarde um congressista Tammany para Nova York) tinha o maior sorriso de todos, com muitos espectadores entrando com muito dinheiro para ver mais lá dentro. Bloom era muito empreendedor, latindo "ballyhoo" e atraindo multidões com introduções e discursos para as pessoas ver o shimmy e os tremidos! Conhecido por alguns como o "Music Man" ele alegou ter improvisado uma melodia no piano em uma coletiva de imprensa em 1893 para introduzir Little Egypt (nome artístico adotado por Fátima). Era a canção mais associada com "danse du ventre" (literalmente dança do ventre), assim chamado pelos homens de Napoleão depois de ver este entretenimento estranho no Egito após a invasão. Bloom nunca se preocupou os os direitos autorais sobre sua composição, que ele deve ter copiado dos músicos do norte da Africa ou dos europeu orientalistas, música que mais tarde inspirou muitas variações, com vários títulos diferentes: the Vaudeville, Hoochy Koochy, Hoolah! Hoolah!, Kutchi Kutchi, dança de Midway, Coochi-Coochi Polka, Nas Ruas o do Cairo, Kutchy Kutchy e, provavelmente o mais famoso de todos, a música Encantador de Serpentes. Ele também alegou ter cunhado a termo "dança do ventre", mas isso pode ter sido auto promoção desse singular feirante. A palavra "coochi" foi derivada do francês "couché", passado de "coucher" que em inglês significa "lay down (deitar)", cujo significado na linguagem popular americana remete a sexo.

Farida começou a viajar pelo circuito das artes e em 1897 estava dançando na Broadway. Com a avançada idade de 62, Spyropoulos dançou como Little Egypt na feira de 1933 “Century of Progres”s in Chicago. Muitos anos mais tarde, muitas pessoas passaram afirmar ser a famosa Little Egypt, tentando ganhar dinheiro com sua fama, mas eles não eram, e hoje, a maioria concorda que era Farida. Algumas foram tão longe ao ponto de afirmar que eram suas filhas ou netas ainda que Farida nunca tenha tido filhos.

Little Egypt - Ashea Wabe

Little Egypt - Fatima Djamile

Uma terceira Little Egypt foi Fatima Djamile. Sabemos pouco sobre ela. Ao que tudo indica ela é a dançarina dos filmes de Thomas Edisons “Coochee Coochee Dance” de 1896 e “Fatima” 1897. O fato dela se chamar Fatima, ajudou na confusão com a Liitle Egypt original, que havia inicialmente adotado o nome de Fatima. Com a divulgação do vídeo, a confusão só aumentou.

Uma interessante razão para haver essa confusão sobre quem exatamente foi Little Egypt reside no fato de que a Grande Exposição de Chicago de 1893 ficava aberta 20h por dia em nenhuma dançarina poderia dançar 20 horas seguidas, sete dias por semana. Ou seja, obrigatoriamente deveria haver várias dançarinas para o mesmo show. Como se sabe hoje, muitas dançarinas (em torno de 100) dançaram na exposição de “Ruas do Cairo”, sendo algumas delas podem ter sido a “Little Egypt” em algum momento durante o evento. No entanto, é provável que a melhor dançarina foi se sobressaindo em relação às demais e está foi Farida Mazar Spyropoulos.

Também estamos cientes de que o Sr. Bloom contratou um monte de garotas de um show anterior que ele viu antes da Exposição de Chicago. Além disso, após o sucesso de “As Ruas do Cairo”, outros promotores rapidamente criaram suas próprias versões de Little Egypt, o que aumentou ainda mais as dançarinas chamadas de little egypt. Estas, por sua vez, foram outros locais, diferentes cidades, estados, países... O estilo Little Egypt passou a ser chamado de “Belly Dance” e o fogo se espalhou, consumindo tudo e arrebatando todas as mulheres que toca, como você, que chegou até o final desse texto, bem sabe! :-)

Solomon Bloom

Sol Bloom tinha apenas 23 anos quando conseguiu organizar seu evento de atrações orientais. Descendente de judeus, colocou um monte de nações "exóticas" num balaio de gato, deu um roupagem vendável e fez uma fortuna. Tornou-se deputado e manteve-se na politica de 1922 a 1949, quando morreu.

Solomon Bloom frequentou a escola por apenas um dia porque seus pais não podiam comprar livros para ele. Filho de imigrantes poloneses, ele foi posteriormente educado em casa por sua mãe em São Francisco, onde também começou a trabalhar em uma fábrica de escovas aos sete anos de idade. Com a idade de dezesseis anos, ele havia estabelecido um negócio próprio e já era rico. Ele era um visitante regular do Woodward’s Gardens, o primeiro museu de São Francisco, que ele considerava uma valiosa fonte de instrução. Bloom produziu uma peça e até construiu seu próprio teatro quando tinha dezessete anos de idade. Na idade de dezenove anos, "Sol" decidiu percorrer o mundo para continuar sua educação, e sua primeira parada foi a 1889 Paris Exposition Universelle. No recinto da exposição, ele viu incríveis exposições de todo o mundo que exibiram as maravilhas da ciência, indústria, arte, história, antropologia e cultura. A exposição que realmente capturou sua imaginação foi a de uma aldeia argelina. Intrigado com tudo o que viu, foi a dança tradicional das mulheres que mais o fascinou. Não tinha muita certeza de como exibiria a companhia de dança, mas tinha certeza de que, se pudesse levá-los - ou até mesmo a exposição inteira - aos Estados Unidos, poderia ganhar uma fortuna com isso. Negociou com os gerentes da exposição e, por uma taxa de cerca de US $ 1.000, obteve o direito de negociar um contrato para exibi-los na América do Norte e do Sul. Logo após seu retorno à América, Bloom soube dos planos para a Exposição Mundial da Colômbia, ou Feira Mundial, que comemorariam o 400º aniversário da chegada de Colombo ao Novo Mundo. O principal concorrente para a grande feira internacional era a cidade de Chicago. Ele foi premiado com os direitos de exposição internacional em 1890, quando o presidente Benjamin Harrison assinou o projeto de lei da exposição. No início de seu planejamento, os comissários ofereceram ao ambicioso funcionário de vinte e um anos a posição de gerente da Midway Plaisance, a área que continha todas as concessões de diversões da feira. Quando lhe pediram para nomear o salário que ele exigia, Sol sabia que ele tinha muito a considerar e pediu uma noite para pensar sobre isso. Quando ele refletiu seriamente sobre a oferta, percebeu que, se aceitasse o emprego, teria que se mudar para Chicago, deixando sua família e sua casa, bem como seus bem-sucedidos negócios de São Francisco nas mãos de outros. No dia seguinte, esperando ser recusado, pediu US $ 1.000 por semana. Muito para sua surpresa, o agente dos comissários concordou. Apenas alguns meses antes, sua maior ambição era contratar uma vaga na Midway. Agora ele o administraria - e com um salário igual ao do presidente dos Estados Unidos! - tudo na tenra idade de vinte e um anos.

Curiosidades

Onde as Little Egypts apresederam a dança do ventre? Elas foram realmente as primeiras?

Bem, a Farida era síria e portando deve ter aprendido em casa. Mas e a Wabe, que era canadense? E a Djamile? E porque usar esse nome, "Fátima"?

São perguntas que não temos respostas, porém podemos inferir. Clique na imagem e repare nas datas. O texto menciona uma Fátima que já dançava em 1881. Não pode ser Farida, pois na época ela teria uns 10 anos.

Exposição Internacional da Filadelfia - 1876

A seção dedicada à Tunísia estava localizada na Avenida Sul, atrás da Dinamarca, Suécia e Turquia. As contribuições desta nação incluíram essências e extratos aromatizantes, cerâmica, tapetes, tapetes, jóias e trajes nacionais contribuídos por sua alteza Sidi Mohamed Essadok, Bey de Tunis. M. Valensi, um comerciante tunisiano, também contribuiu com mercadorias que estavam à venda durante toda a exposição e consistia em produtos folclóricos, tubos turcos com cabeças de cerâmica e hastes de cana muito compridas, além de tabaco turco. O Sr. Valensi também foi responsável pela importação dos músicos e dançarinos, que cantaram e dançaram suas melodias nativas em uma espécie de plataforma elevada em seu Bazar e Café da Tunísia. O café também era servido aqui e os visitantes recebiam a novidade de fumar tabaco turco em tubos de dois metros de comprimento. O bei de Túnis também exibiu duas tendas árabes, ilustrando a vida doméstica e os costumes dos xeques e beduínos árabes.

A exibição turca era semelhante à da Tunísia, exceto pelas massas de ópio embrulhadas em folhas. Os tapetes turcos foram altamente elogiados. O bazar turco e o Café eram presididos por turcos nativos, vestidos em trajes nativos, boné vermelho, túnica vermelha, faixa amarela, calças de seda azul e marrom. Eles ofereciam aos visitantes café e cachimbos, o primeiro servido em pequenas xícaras do tamanho de uma xícara de ovo. Dispersos por toda a sala havia pequenos bazares vendendo roupas ricas, tapetes, cachimbos, espadas, punhais, punhos e muitos outros novos ornamentos.

O Egito teve uma exibição interessante dos produtos e recursos daquele país fértil e lembranças de seu antigo esplendor. Um café turco foi exposto, feito em filigrana, de ouro de 22 quilates. O conjunto foi avaliado em US $ 4.400. Móveis incrustados de pérolas e marfim evidenciavam o esforço mais diligente e minucioso por parte dos operários egípcios. Sabres, selas, sedas, vinhos, ópio, antiguidades e gravuras hieroglíficas de múmias também foram exibidas. A exposição foi descrita como uma dedicação do "país mais antigo do mundo ao país mais jovem do mundo".

Esboços mostram trabalhadores tunisianos construindo um bazar. Uma gravura retrata uma cena do café da Tunísia: dançarinos e músicos no palco tocando enquanto jovens crianças tunisianas servem o exótico café turco aos clientes vitorianos. As mulheres esperam por seus homens em uma antessala enquanto os homens tentam o narguilé (cachimbo de água) ou o chibouk (cachimbo longo de madeira).

Quando a Exposição terminou em novembro de 1876, quase dez milhões de pessoas compareceram. Os portões arrecadaram cerca de US $ 4 milhões. Todos os tipos de artigos do Centenário foram oferecidos em leilões públicos, e ansiosamente comprados pelo público. Mobília egípcia, turca e tunisina, joias e bugigangas foram vendidos pelo maior lance. É, sem dúvida, como tantas lembranças do Oriente Médio se tornaram hieróglifos que, de alguma forma, acabaram em lojas de antiguidades em toda a América, provenientes das vendas de propriedades.

Não houve evidência de qualquer raiva ou furor sobre as dançarinas durante a Exposição, como aconteceu na Feira Mundial de Chicago em 1893. A exposição foi considerada um sucesso. Como disse um historiador: “Esse vasto empreendimento foi fielmente conduzido a uma conclusão de glorioso triunfo”.

Dani Camargo